Crítica | Alien: Romulus

Da mesma maneira que o parasita agarra-rosto que se tornou o pior pesadelo de todo fã de ficção científica, a franquia Alien sempre cresce para dentro. Da alienígena mãe de Aliens: O Resgate (1986) aos Engenheiros de Prometheus (2012) até os mandamentos corporativos de Covenant (2017), há um ímpeto, às vezes mais vocalizado, outras vezes em subtexto, de encontrar-se com o criador e de assimilar as elucubrações acerca da própria gênese e, principalmente, do processo que leva ao desenvolvimento desta fecundação.

Alien: Romulus (Idem, 2024), sétimo título da cinessérie iniciada em 1979, parte dessa busca transcendental da criação e dos desdobramentos de vida enquanto também medita levemente sobre a contraposição entre livre-arbítrio e submissão por imposição. Partindo de uma mitologia conhecida, o cineasta uruguaio Fede Álvarez constrói uma narrativa que, volta e meia, trata da desilusão dos mais jovens em relação ao presente. Que sejam atacados por xenomorfos adultos altamente hostis é só um complemento.

Tanto é que o antídoto para tal crise é a chegada em um planeta chamado Yvaga justamente para se ter uma vista do sol, o que expande a compreensão da plateia já acostumada à ideia de seres humanos serem tratados como lixo descartável. No capitalismo, tudo se transforma em produto. Para um produto vender, precisa-se criar memória. Daí, a vontade de regressar. Aqui, a protagonista Rain (Cailee Spaeny) só quer sentir a verdade de um ambiente não adulterado, falso e traiçoeiro. É objetiva enquanto procura sempre por um caminho aberto, alternativo, em direção ao sol. Por isso, a excelente cinematografia de Galo Olivares propõe uma distinção entre as luzes de acordo com a emoção dos personagens (o sol é cálido, gentil e levemente amarelado) e a contextualização espacial (o exterior colônia é banhado por um alaranjado artificial, enquanto os corredores da nave Romulus, infestados pelos extraterrestres hostis, são quase sempre claros).

Essa predileção temática por um regresso a um lugar ao sol do qual se sente falta é sintomática da nostalgia instaurada pelas produções hollywoodianas que seguem um esteio já consolidado. Assim, Álvarez, a despeito de seu talento para a criação de tensão e controle visual célebre, se rende a incontáveis momentos durante os quais remete a plateia a episódios ou imagens incontornáveis da franquia: a heroína usando um traje espacial para enfrentar a ameaça é Ripley no clímax do primeiro Alien; a hora de pegar em armas dialoga com Aliens: O Resgate; a aproximação entre o xenomorfo e a protagonista, face a face, vem diretamente de Alien 3 (1992); os experimentos genéticos relembram Alien: Ressurreição (1997); o design e a coloração de certa criatura são bem próximos do que se viu em Prometheus e a reprodução de Das Rheingold, de Wagner, vem herdada diretamente de Covenant. Tantas referências podem até acalentar fãs mais saudosos, mas é de se lamentar, ainda que isto não comprometa as realizações criativas desta obra, a necessidade de pegar emprestado o que deu certo antes, como num clipe estendido de melhores momentos.

Ainda assim, o filme é capaz de contornar sua autofagia reverente ao propor uma dinâmica dramática entre Rain e o androide Andy (o ótimo David Jonsson), na qual existe uma relação de poder e subordinação, não obstante mediada por alguma afeição. É aí que a empreitada de Álvarez encontra uma razão de ser: Andy é a criatura feita para proteger Rain e, desta forma, precisa aceitar passivamente todas as decisões que ela vier a tomar. Se um apenas acata e o outro toma todas as ações, onde existe espaço para afeto? Se a natureza de Andy é obedecer, qual é a diferença entre as configurações feitas por Rain ou pela Weyland-Yutani? Ela seria capaz de deixá-lo em uma versão defeituosa se isso implicasse a sua obediência absoluta? São alguns questionamentos interessantes pelos quais ambos os personagens perpassam a narrativa, se consolidando como parte interessante do cânone.

O espelho temático entre criador e criatura também se apresenta no terceiro ato de Alien: Romulus, desta vez, como uma loucura assombrosa: o monstro que persegue humanos pode até ser um alienígena mortífero, mas foram os instintos autodestrutivos e gananciosos da corporação terráquea que causaram todos os males vistos ao longo dos capítulos anteriores. Logo, faz sentido que um se alimente e exista à semelhança do outro. Fede Álvarez consegue compreender que o principal horror e fascínio mórbido que temos pelo body horror e pela perseguição em um ambiente pequeno se baseia em um princípio: o de que a assombração seja tão ou mais inteligente e incompreensível do que nós mesmos.

7.5/10